Como você resolve um conflito? A resposta depende, entre outros fatores, do seu conhecimento sobre os diferentes meios existentes. Conciliação é um, mas existem outros. Você pode pensar que cada meio é uma porta, como na imagem do banner abaixo. Uma das portas é o Poder Judiciário, em que o conflito é resolvido por um juiz. Neste artigo explico quais são as outras.
Conciliação e outros meios de resolução de conflitos
Conforme expliquei no primeiro post da série Faculdade de Direito, a ideia é escrever sobre cada disciplina que estou cursando no semestre. O texto será um resumo dos conhecimentos aprendidos. Dessa forma, ao publicá-lo, estudarei a matéria e compartilharei informações com vocês.
Hoje vou falar da disciplina chamada MASC I, que significa Meios Adequados para a Solução de Conflitos, parte I.
Origem e Contexto da Disciplina
Antigamente, na Universidade São Judas Tadeu, o conteúdo dessa disciplina era dado dentro de Processo Civil I. Contudo, conforme a importância do conteúdo foi aumentando na sociedade, ela conquistou seu espaço e se consolidou como uma disciplina independente, que continua em MASC II, no 9º semestre do curso.
Como o nome sugere, ela trata de formas de resolver conflitos fora do Poder Judiciário. A sigla MASC no passado correspondia a Meios Alternativos para Solução de Conflitos, porém, como o termo “alternativos” pode ter uma conotação dúbia, no sentido de algo que foge do padrão, a letra “A” passou a representar a palavra “Adequados”. O nome dessa disciplina pode aparecer também como RAD (Resolução Apropriada de Disputas).
Desconfio que essa matéria existe de forma independente apenas na grade da USJT, pois não a encontrei com esse nome (e nem como RAD) em outras grades que analisei antes de ingressar no curso de Direito, mas ainda não fiz uma pesquisa sobre isso.
Características e Grade da Disciplina
MASC é uma disciplina que transita entre a Ciência do Direito e a Dogmática Jurídica. Ela faz parte do eixo de disciplinas profissionalizantes, e não do fundamental, conforme a imagem abaixo.
Sendo assim, é natural que seu conteúdo aborde normas jurídicas, mas não desde o início. Os seguintes tópicos são vistos em MASC I:
- Conflitologia
- Autotutela
- Autocomposição (Acordo, Negociação, Mediação e Conciliação)
- Heterocomposição (Arbitragem e Jurisprudência)
- Acesso à justiça (ondas renovatórias, sistema multiportas, Juizado Especial, CEJUSC e capacidade postulatória)
- Arbitragem
Para saber mais sobre cada tópico, clique sobre os que possuem link.
As primeiras aulas são dedicadas para Conflitologia, que é a ciência que estuda conflitos. Ela não é uma ciência jurídica, logo, o início desse assunto consiste em estudar conflitos que não necessariamente são litígios (quando o conflito é submetido para o Estado para ser decidido por um terceiro – juiz). Falei mais desse tópico aqui.
Por fim, a grade, até o final da disciplina, cobrirá os diferentes meios de solução de conflitos efetivamente.
Explicação sobre as portas
Imagine que você tem um conflito. Por exemplo, um acidente de trânsito, uma dívida com o banco ou uma desavença com seu vizinho. Pense agora que cada meio de resolver o conflito equivale a uma porta.
Vamos desconsiderar formas primitivas, como o emprego de violência. Aliás, esse tipo de forma é conhecido como autotutela. É uma forma proibida pelo art. 345 do Código Penal (CP), que estabelece que é proibido fazer justiça pelas próprias mãos, com raras exceções (legítima defesa da vida e da propriedade que, estão, respectivamente, no art. 25 do CP e no art. 1210, §1, do Código Civil).
Se você levar o caso para a Poder Judiciário, o conflito será resolvido por um terceiro, o Estado-Juiz. Assim, uma das portas é a justiça Federal, comum ou trabalhista, ou Estadual. Porém, mesmo sendo o meio mais conhecido, repare que nem sempre é a melhor opção na medida que o juiz não conhece as partes, talvez não entenda plenamente do assunto a ser julgado, possivelmente não partilhe dos mesmos valores que você e agirá conforme seu juízo, embora dentro da lei.
Uma outra porta é a conciliação. Nesse caso, o conflito é resolvido pelas partes, com auxílio de um terceiro, o conciliador. Ele ajuda as partes a chegarem em um acordo, mas não é ele quem decide. Esse meio é indicado para relações pontuais, como uma dívida em banco.
Já em relações continuadas, como em um conflito envolvendo pensão alimentícia, o ideal é usar a mediação, outra porta. Nela, um terceiro, o mediador, procura restabelecer a comunicação entre as partes para que elas cheguem em um acordo. Assim, tecnicamente, mediação e conciliação são diferentes, mas ambas representam técnicas autocompositivas, em que as partes decidem o conflito sem usar o Poder Judiciário. Há ainda as portas: negociação e arbitragem.
Principais Conhecimentos
A seguir irei enumerar os conhecimentos, mas antes quero fazer algumas observações. Primeiro, a percepção dos principais ensinamentos é algo subjetivo e individual, portanto os comentários expressam a minha visão. Segundo, adicionei alguns conhecimentos que não são necessariamente da teoria, mas reflexos ou comentários durante as aulas sobre a sociedade atual. Por fim, a matéria ainda não acabou, mas já estamos no último tópico e a menos de um mês de seu encerramento. Eis a lista:
- Conflito não é a mesma coisa que litígio, mas este é a mesma coisa que lide.
- Não devemos prevenir conflitos a todo custo. Eles representam elementos da vida que permeiam todas as relações e contém potencial para proporcionar evolução pessoal, profissional e organizacional se forem conduzidos construtivamente.
- Conflitos podem ser positivos e isso está diretamente relacionado à capacidade de resolvê-lo com um processo construtivo no lugar de um destrutivo.
- Um conflito, na teoria, pode ser resolvido com técnicas de 3 categorias: autotutela, autocomposição e heterocomposição, mas a primeira corresponde a uma forma primitiva (violência) e que é admitida somente em raras exceções e com restrições.
- Um acordo justo pode resolver um conflito e isso pode ser atingido usando técnicas autocompositivas, como negociação, conciliação e mediação.
- Caso não seja possível chegar em um acordo com técnicas autocompositivas, é possível resolver o conflito com técnicas heterocompositivas, como arbitragem e jurisdição. Contudo, uma vez escolhida uma delas, não se pode escolher a outra.
- A jurisdição é exercida pelos órgãos do Poder Judiciário e suas decisões são, em regra, recorríveis, enquanto que as decisões da arbitragem não permitem recurso.
- Acesso à justiça (social) é mais amplo do que acesso ao Poder Judiciário, dado que este corresponde apenas a um dos meios de resolver conflitos.
Tópicos fora da grade
Uma outra parte proveitosa dessa disciplina foram dicas e comentários que a professora (Adriana Preti, da Preti Advocacia) passou sobre o cotidiano da advocacia.
- No Brasil, vivemos a cultura da litigiosidade, que busca mais lide do que acordos. Ou seja, mesmo constando na lei o estímulo para técnicas que não dependam do Poder Judiciário, a realidade brasileira está muito longe disso.
- Em audiências com um(a) juiz(juíza) que não cumpre as regras legais, não se deve discutir com ele(a), mas sim pedir que a decisão ilegal conste em ata. Dessa forma, constando na ata, será possível recorrer para anular a sentença em virtude de não ter sido respeitado o procedimento legal.
- Empresas são as maiores utilizadoras de técnicas de arbitragem para resolver conflitos trabalhistas. Contudo, quando o contrato é imposto de forma unilateral, em que configure algum vício de consentimento, a arbitragem pode ser discutida judicialmente.
- O povo brasileiro conhece muito pouco todos esses métodos que podem ser usados no lugar do Poder Judiciário: negociação, mediação, conciliação e arbitragem, especialmente esta última. O mais famoso é a conciliação, mas é difícil achar uma pessoa que não seja da área e saiba explicar como funciona na prática.
Bibliografia da matéria
A bibliografia dessa disciplina parece pequena, mas diversos materiais complementares foram fornecidos e abordados durante as aulas. A seguir, listei as referências da disciplina com os links quando possível.
[1] Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Manual de Mediação Judicial. 6. ed. Brasília, 2016. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/07/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf>. Acesso em: 06 maio 2019.
[2] Vade Mecum 2019 Compacto.
Referências utilizadas na disciplina
[3] – Publicação original: DEUTSCH, Morton. The resolution of conflict: constructive and destructive processes. New Haven and London: Yale University Press, 1973. Pp. 1-32; 349-400. Traduzido por Arthur Coimbra de Oliveira e revisado por Francisco Schertel Mendes. Disponível em: <http://www.arcos.org.br/livros/estudos-de-arbitragem-mediacao-enegociacao-vol3/parte-ii-doutrina-parte-especial/a-resolucao-do-conflito>. Acesso em: 19 mar. 2019.
[4] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.
[5] BRASIL. Lei n. 10.406, 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 05 maio 2019.
[6] BRASIL. Lei n. 13.105, 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 05 maio 2019.
[7] BRASIL. Lei n. 13.140, de 26 de junho de 2015. Lei da Mediação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.htm>. Acesso em: 05 maio 2019.
[8] BRASIL. Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 1996. Lei da Arbitragem. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9307.htm>. Acesso em: 05 maio 2019.